RIO — Após ser internado no Hospital Casa São Bernardo, na Barra, no dia 17 de março, o cantor e compositor Agnaldo Timóteo morreu neste sábado, em decorrência de complicações relacionadas à Covid-19, aos 84 anos.
Timóteo chegou a receber a primeira dose da vacina contra o coronavírus, mas foi diagnosticado com a doença após sentir-se mal, com pressão baixa, segundo relato de seu sobrinho, Timotinho Silva. O cantor chegou a deixar a UTI na sexta-feira (19), mas não resistiu à infecção. Em 2019, o cantor passou 59 dias internado, após sofrer um acidente vascular cerebral (AVC) no mês de maio.
Agnaldo sempre gostou de cantar. Na década de 50, o programa “Domingo é dia de folga”, de Governador Valadares, anunciava o “Curió de Caratinga” antes da entrada da voz poderosa, apesar de ainda adolescente, do jovem Agnaldo Tiomóteo. O artista, que na época trabalhava como torneiro mecânico, buscava ali o início de uma trajetória profissional — ou melhor, de um sonho que começara ainda na infância, em sua Caratinga natal, quando ele gostava de imitar vozes como as de Cauby Peixoto e Anísio Silva.
Engraxate, entregador de malas, vendedor de manga.
A caminhada até ali havia sido difícil. Ainda em Caratinga, Agnaldo trabalhava desde os 9 anos (entregando malas na estação, engraxando sapatos, vendendo mangas ou pastéis feitos pela mãe) para ajudar a família. Participou de seus primeiros concursos como cantor, nos circos que chegavam à cidade. Aos 16, se mudou para Governador Valadares e começou a cantar nas rádios locais. Mais tarde foi para Belo Horizonte em busca de mais oportunidades — lá ficou conhecido como o “Cauby mineiro”, muitas vezes como uma espécie de “substituto” local do cantor.
Foi em Belo Horizonte que foi ouvido por seu ídolo Anísio Silva, que o apresentou a seu empresário Kléber Lisboa. Namorado de Ângela Maria, Kléber apresentou Agnaldo à cantora, que o aconselhou a ir para o Rio, onde sua carreira teria mais chances de acontecer. Ele seguiu a sugestão e em 1960 desembarcou na nova cidade, onde pôde conhecer um jovem Roberto Carlos também recém-chegado e buscando espaço como cantor.
Sem conseguir emplacar a carreira, Agnaldo pediu uma ajuda para Ângela, que o empregou como seu motorista. Ela também o indicou para o selo Caravelle, que em 1961 lançou seu primeiro disco, um 78 rotações que tinha num lado “Sábado no morro” e no outro “Cruel Solidão”. As gravações não tiveram repercussão. Em 1963, ele gravou “Trotura de amor”, de Waldick Soriano, já dentro do estilo romântico que o consagraria no futuro, mas novamente as vendagens foram pífias — 180 cópias vendidas de mão em mão pelo próprio Agnaldo.
‘Surge um astro’
Em 1965, Agnaldo chamou a atenção interpretando “The house of the rising sun”, dos Animals, no programa “Rio hit parade”, de Jair de Taumaturgo. A partir dali, conseguiu lançar seu primeiro álbum, “Surge um astro” — o primeiro dos mais de 50 que lançaria ao longo da carreira. Em 1968, gravou “Meu grito”, de Roberto Carlos e Erasmo Carlos, num disco que vendeu 600 mil cópias, colocando-o num novo patamar e reafirmando seu lugar como cantor romântico.
“A galeria do amor”, lançada em 1975, foi outro marco em sua carreira. Sua primeira composição própria — referência à Galeria Alaska, então ponto de entro gay do Rio — alcançou um enorme sucesso e abriu um novo caminho na carreira de Agnaldo. Canções como “Perdido na noite”, de 1977, exploravam a temática urbana noturna.
Político e camelô dos próprios discos
Em 1982, Agnaldo usou sua popularidade como cantor — e seu carisma alimentado por posições polêmicas — para entrar na vida política. Elegeu-se deputado federal pelo PDT naquele ano. Seu primeiro discurso foi aberto com a expressão “alô, mamãe”, que se tornou uma espécie de bordão seu — chegou a lançar alguns sucessos em homenagem à figura materna, como “Mamãe” e “Mãezinha querida”.
Mais tarde, em 1986, chegou a concorrer a governador do Rio. Depois de se eleger vereador em 1996 e não se reeleger em 2000, passou a concorrer em São Paulo, onde foi eleito como vereador em 2004.
Nos anos 2000, Agnaldo chamou a atenção da imprensa ao ir para a rua vender seu disco, como um camelô. Ele dizia vender uma média de 400 CDs a cada vez que armava sua barraquinha.
“Eu, pecador”, documentário de Nelson Hoineff lançado em 2017, conta a história do cantor e expõe suas opiniões controversas, das quais ele sempre se orgulhou: