Desde o início da pandemia do novo coronavírus, o uso de máscaras já foi alvo de mentiras por parte do presidente Jair Bolsonaro e de desinformação pelo Ministério da Saúde. A máscara de protecao contra Covid-19 ganhou uma importância ainda maior após estudos indicarem que o uso no momento da contaminação pode diminuir a gravidade da infecção que os pacientes irão desenvolver.
Na prática, a utilização correta da proteção pode fazer com que pessoa, ao ser infectada, se exponha a uma menor carga viral e que, a partir disso, desenvolva sintomas mais leves, reduzindo significativamente as chances de internação e óbito.
A conclusão vem da combinação de dois estudos realizados nos Estados Unidos.
O primeiro, publicado no periódico científico de nano-ciência ‘ACS NANO’, analisou as formas de transmissão aéreas da Covid-19. Já o segundo, realizado pelo NHI (Instituto Nacional de Saúde) — National Institute of Health, em inglês —, focou em analisar a gravidade da doença relacionada com a forma de transmissão pelo ar.
De acordo com a publicação do NHI, os cientistas avaliariam três formas de infecção da Covid-19: inoculação na mucosa nasal; exposição a aerossóis (micropartículas suspensas no ar); e por contato físico com objetos contaminados (chamada de fomite).
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Dentre as três, a infecção por objetos contaminados levava a uma forma da doença mais branda. Já na comparação entre as duas primeiras, o contágio por exposição aos aerossóis mostrou que o infectado inalava uma quantidade maior do vírus.
“Quando inalamos as partículas carregadas de vírus, elas se depositam em diferentes regiões do sistema respiratório. Os aerossóis maiores (de 5-10 micrômetros), se depositam na parte superior da garganta, nariz e traqueia. Os de tamanho médio (de 1-5 μm), se depositam nos brônquios e pequenas vias aéreas. E os aerossóis realmente pequenos (menores que 1 μm) podem penetrar até os alvéolos”, explica o pesquisador Leonardo Rovatti de Oliveira, membro da Rede Análise COVID-19.
São os alvéolos os responsáveis por fazer as trocas gasosas do pulmão com o sistema sanguíneo. Ou seja, eles coletam o oxigênio inspirado, enviam à corrente sanguínea e retiram dela o gás carbônico utilizado pela células e que sai na expiração.
“Por isso, ao contrário de outro modo de transmissão em que o vírus atinge primeiro o nariz e depois chega aos pulmões se multiplicando, a infecção por aerossóis pode atingir diretamente a região dos alvéolos e gerar o colapso das células alveolares”, completa Rovatti.
Atacando de imediato os alvéolos, o novo coronavírus pode provocar instabilidade alveolar, insuficiência respiratória e levar a uma forma mais agressiva da doença.
COMO AS MÁSCARAS PODEM EVITAR OS AEROSSÓIS COM COVID-19?
Quando um indivíduo infectado pelo novo coronavírus tosse, espirra, fala ou até mesmo respira, ele produz e emite gotículas de diferentes tamanhos e carregadas com o vírus SARS-CoV-2. O destino delas dependendo do tamanho de cada uma e das condições do ambiente.
Se são grandes e em um ambiente pouco ventilado, essas gotículas caem rapidamente no solo. Já as gotículas menores — os chamados aerossóis —, por serem mais leves, permanecem no ar por um longo período, e com isso conseguem viajar mais longe da origem.
Estudos demonstram que em um ambiente fechado, como restaurantes, por exemplo, uma pessoa infectada e sem máscara emite partículas que serão inaladas em até 1 minuto pelas demais ocupantes do mesmo espaço. Em 10 minutos, grande parte do ambiente já estará contaminado com aerossóis potencialmente carregados com o vírus.
A importância da máscara serve tanto para quem não quiser infectar quanto para quem já está infectado pela Covid-19 e não sabe.
Isso porque as máscaras fazem com os aerossóis não “entrem” ou “saiam” delas de forma linear, mesmo as caseiras e de pano, que não possuem uma capacidade de filtragem tão alta.
“Dessa forma, as máscaras diminuem muito a carga viral inalada ou exalada ao ambiente. Por isso, se for contaminado e exposto a uma menor carga viral, o quadro de infecção consequentemente pode ser mais leve”, conclui o pesquisador e divulgador científico.
É preciso atentar-se também à qualidade e condição das máscaras. Rovatti elenca cinco dicas importantes:
- Dê preferência às máscaras cirúrgicas do tipo N95 ou PFF2, mais eficientes e de melhor vedação;
- Caso a máscara seja caseira ou de pano, é preciso ter, ao menos, 3 camadas de tecido;
- Fique atento aos “prazos de validade” delas — de 2 a 5 reutilizações para as cirúrgicas, e até 30 lavagens para as caseiras e de pano. Depois disso, os dois tipos perdem a capacidade de filtragem;
- Evite as máscaras com válvulas, elas filtram apenas o ar inspirado. Ou seja, se você estiver contagiado, emitirá partículas contaminadas para o ambiente;
- Caso for ajustar a máscara, lave as mãos antes e depois para não contaminá-la e nem se contaminar;
Outros pilares importantes são o distanciamento social das outras pessoas fora de seu círculo familiar e a ventilação do ambiente.
CONTROVERSAS SOBRE A CONTAMINAÇÃO DA COVID-19 PELO AR
O uso de máscaras e a própria possibilidade de contaminação da Covid-19 pelo ar já estiveram no centro de controvérsias durante a pandemia.
Apesar de o vírus circular pelo mundo desde dezembro de 2019, somente em julho a OMS (Organização Mundial da Saúde) reconheceu “evidências emergentes” de transmissão pelo ar da Covid-19. O Centro de Controle e Prevenção de Doenças do governo dos Estados Unidos, instituto de referência sobre como lidar com a doença, também adverte que a Covid-19 pode, sim, ser transmitida pelo ar.
Apesar disso, o Ministério da Saúde traz uma informação errada na página de perguntas frequentes do site oficial da pasta.
À pergunta “O Covid-19 é transmitido pelo ar?”, a pasta responde: “Não, a transmissão acontece de uma pessoa doente para outra ou por contato próximo, por meio de: aperto de mãos (principal forma de contágio); gotículas de saliva do nariz e/ou da boca; espirro; tosse; catarro; objetos ou superfícies contaminadas, como celulares, mesas, maçanetas, brinquedos, teclados de computador etc.”
O aplicativo Coronavírus SUS, plataforma oficial do Ministério da Saúde, diz que se deve usar máscara apenas “se estiver tossindo ou espirrando para evitar transmitir vírus para outras pessoas. Para pessoas saudáveis, use máscara somente se você estiver cuidando de uma pessoa com suspeita de infecção por coronavírus”, diz o texto. E conclui: “As máscaras são eficazes somente quando usadas em combinação com a limpeza frequente das mãos”.
Essa, de fato, era a recomendação no começo da pandemia temendo que faltassem máscaras destinadas aos profissionais de saúde, mas estudos posteriores mudaram a orientação. Embora a recomendação esteja errada no aplicativo oficial, o site do Ministério da Saúde atualizou a recomendação e até disponibiliza, desde abril, um guia de como fabricar máscaras caseiras.
Já o presidente segue mentindo a respeito da eficácia das máscaras.
Em 28 de novembro, Bolsonaro mentiu ao dizer que máscaras são “pouco eficazes” no combate à Covid-19.
“A última coisa que falta eu acertar é a máscara. Quando você pega na máscara já contamina, já não tem… e aperta na mão do outro, e não sei o que, e entra no ônibus. E essa máscara é pouco eficaz. Já tem alguns médicos que estão falando que é um percentual baixo de eficácia”.
Em outra oportunidade, em sua live realizada na mesma semana, o presidente afirmou que a eficácia da máscara será “o último tabu a cair” em relação à pandemia.